Covid-19 e as relações trabalhistas

Diante de um cenário como o atual, de calamidade pública em consequência de uma pandemia gerada por um vírus como o Corona (COVID-19), é necessário que se avaliem alguns aspectos que levaram o governo a implementar medidas emergenciais como a Medida Provisória nº 927, de 22 de março de 2020 que objetivam melhorar as relações entre empregador e empregado, além de antecipar e prevenir possíveis conflitos que sejam gerados como resultado de alterações nas rotinas de trabalho motivadas pelo isolamento social e o trabalho remoto ou tele trabalho.

Sabemos que grande parte das empresas, devido a pandemia, se obrigaram a determinar que seus funcionários passassem a operar suas funções diretamente de suas casas, o chamado tele trabalho ou home office, evitando a proximidade física com colegas, clientes ou fornecedores, que é fator determinante para disseminação da pandemia, segundo indicam os especialistas.

Mas o que ficou estabelecido na MP com relação ao Tele trabalho?

1. O trabalho na residência do empregado já não é novidade, pois surgiu através da Lei nº 13.467/17. Ocorre que nos dias atuais está sendo praticado com mais intensidade com base no Direito Potestativo do empregador.

A iniciativa pode ser exclusiva do empregador, usando seu direito potestativo, com 48 horas de antecedência do início do TR (trabalho remoto), porém caberá ao empregador fornecer todo o material necessário para que o empregado possa cumprir suas tarefas ou até utilizar aqueles equipamentos já existentes em sua residência mediante compensação de custos e sem serem considerados como salário-utilidade, sem natureza salarial. Nesse caso é aconselhável, para ambas as partes, que essa alteração seja estabelecida de forma escrita, até mesmo para estipular eventuais custos como energia elétrica, internet e etc.

Outra possibilidade muito utilizada pelos empregadores para diminuir despesas nesses tempos é a antecipação de férias.

2 - A ANTECIPAÇÃO DE FÉRIAS foi permitida na recente Medida Provisória n. 927/20, art. 3, a qual ainda precisa ser chancelada pelo Congresso Nacional, mas nestes casos cabe analisar:

a) Quando o empregado já está com período aquisitivo completo, mas não tem ainda previsão de fruição das férias. Neste caso o empregador poderá notificar o empregado, para que com 48 horas, da data da notificação, passe a usufruir do descanso de férias. Tecnicamente não se trata de uma antecipação, mas de uma ruptura legislativa, de iniciativa exclusiva do Governo, quanto a temporariedade da notificação de início de férias, uma vez que já estavam conquistadas pelo trabalhador.

b) Numa segunda hipótese, aí sim, tecnicamente, ocorreria a antecipação das férias, mais uma vez pela Potestade do empregador, que poderá conceder férias, proporcionalmente ao período de trabalho, sem que seja completado o período aquisitivo (12 meses de trabalho, para obter 30 dias de férias).

Estas situações se prestam para os casos em que não há como desenvolver o teletrabalho e a empresa está em situação de dificuldades para suprir os pagamentos da folha de pagamento.

Férias Coletivas

3. Mais tormentosa é a situação das FÉRIAS COLETIVAS. Nesta circunstância, o Poder Público resolveu afastar a necessidade de participação Sindical e notificação ao Ministério da Economia. Foi mais audaz o legislador e concedeu amplo poder potestativo ao empregador, para a concessão das mesmas (férias coletivas), bastando apenas notificar o trabalhador com 48 horas de antecedência do início de fruição.

Banco de Horas

4. No BANCO DE HORAS, nenhuma novidade, pois foi escrito o que já se praticava, com o empregador concedendo folgas para compensar horas existentes no Banco de captação.

Feriados

5. Os FERIADOS podem ser antecipados, mas sem prejuízo financeiro ao trabalhador. Não podem ser antecipados os feriados religiosos sem que haja concordância expressa do empregado.

Exames Médicos

6. Quanto aos EXAMES MÉDICOS OCUPACIONAIS. Os admissionais devem ser realizados. Está suspensa a exigibilidade de exames médicos demissionais neste período de calamidade pública.

Treinamentos

7. O TREINAMENTO PERIÓDICO, nas empresas cujas profissões estavam obrigadas a tanto, está suspensa a exigibilidade, igualmente, neste ínterim.
8. O RECOLHIMENTO DO FGTS, como dizem os interlocutores do Poder Público, está diferido, isto é, está adiado o prazo de recolhimento por 03 meses. Mas, poderá ser prorrogado o recolhimento em face do desenvolvimento ou não da pandemia.

Faltas

9. As FALTAS AO TRABALHO, serão um verdadeiro tormento aos departamentos de Recursos Humanos – RH das empresas. Existe situação de isolamento, de quarentena e legais, muito embora todas tenham que ser justificadas e aqui sequer há necessidade de apresentação de atestado médico. Nas faltas justificadas e nas de isolamento, ocorre a interrupção do contrato de trabalho, com contagem do tempo de serviço.

Enfim, trata-se de período extremamente tumultuado, no qual o que se pretende é a preservação de emprego e de renda (salários), mesmo que parcialmente, com adequações (reduções salariais) que podem ser efetivadas de 25% até 70% dos ganhos dos trabalhadores e até mesmo a suspensão total de trabalho, sendo que eventual parcela de remuneração seria objeto de contraprestação pelo Poder Público, consoante os termos da Medida Provisória nº 936, de 01 de abril de 2020, a qual deverá ser objeto de estudo mais aprofundado.

O estado de calamidade pública foi reconhecido e instituído pelo Decreto Legislativo nº 6 de 20/03/2020. Agora, para enfrentar o estado de emergência da saúde pública, motivado pelo Corona vírus, foi editada a MP nº 927 de 22/03/2020, deliberando sobre medidas trabalhistas, enlaçando as relações jurídicas existentes entre patrão e empregado, sob o manto justificativo/protetivo da redução do desemprego, com temporariedade limitada ao estado de calamidade pública e amparado no Estado de Força Maior, inserto no artigo 501 da CLT.

A MP, em comento, trata sobre medidas (legalmente autorizadas) que poderão ser adotadas pelos empregadores (art. 1º), todavia, o artigo 2º da referida MP dá conta que a alteração contratual deve obedecer a bilateralidade existente nos contratos de trabalho e, por conseguinte, esta alteração deve ser celebrada por acordo individual escrito, que prevalecerá sobre qualquer outra forma de normatização, quer seja convencional ou legal, exceto as previsões Constitucionais.

A medida provisória peca por impropriedades técnicas, por exemplo, nos artigos 1º e 3º está que as transformações poderão ser adotadas pelos empregadores, mas no artigo 2º disciplina a forma das alterações ora trazidas ao bojo da relação jurídica pré-existente e daí se entende que qualquer alteração contratual deve obedecer a manifestação de vontade das partes envolvidas e a bilateralidade contratual, não o simples direito de Potestade do empregador.

Mas no artigo 3º volta o legislador a elevar o direito potestativo do empregador concedendo-lhe direito de adotar medidas quanto ao tele trabalho; antecipação de férias individuais; concessão de férias coletivas; aproveitamento e a antecipação dos feriados; o banco de horas; suspensão de exigências administrativas em Segurança e Saúde do Trabalho; direcionamento do trabalhador para qualificação; diferimento do recolhimento do FGTS.

Certamente não conseguiremos tratar sobre todas estas alterações, mas tenha certeza, que serão geradas muitas demandas judiciais.

Apesar da MP 297 ainda não ter sido aprovada pelo Congresso Nacional, fique atento, reúna documentação e faça anotações que sejam pertinentes durante esse período e, caso sinta-se prejudicado de alguma forma, consulte seu advogado.

Dra Viviana Menna  Dra. Viviana Menna