Quem comprou o imóvel na planta, acreditando em manter-se no emprego, na inflação contida e nos juros baixos, hoje, com a crise que o país vem enfrentando, pode estar em dificuldades para quitar o saldo devedor na entrega do imóvel, tendo que recorrer a um possível o cancelamento do contrato. Nesses casos qual seria a opção do comprador?

Havendo motivos qualquer uma das partes no contrato de compra e vendo o imóvel pode propor a RESCISÃO DO CONTRATO, mesmo que sendo o comprador inadimplente, diante das cláusulas contratuais.

Compra de Imóveis na Planta

A proposta de rescisão pode ser formalizada por escrito.

Partindo do comprador devedor a proposta de rescisão este ficará ciente de que a sua desistência gerará um ônus, resultando necessariamente na perda de parte dos valores investidos, a título de multa.

AS CONSTRUTORAS PODEM RETER TODO O VALOR PAGO PELO COMPRADOR?

Primeiramente, cabe esclarecer que os contratos estipulados pelas construtoras são de adesão, ou seja, não há possibilidade do comprador opor modificações em suas cláusulas. Na maioria dos casos tais contratos trazem estabelecida multa contratual pela desistência motivada pelo comprador em valores abusivos ou são omissos quanto à estipulação de clausulas de rescisão, nesse último caso a abusividade ocorre com a retenção da totalidade do valor pago.

Acontece que, em obediência às normas do Código de Defesa do Consumidor e aos princípios jurídicos que regem os atos negociais desta natureza, em especial a bilateralidade e o necessário equilíbrio contratual, ainda que não haja previsão expressa no contrato é possível que o comprador por motivos pessoais, sejam quais forem, pleiteie a rescisão.

Mas então qual é o valor justo a ser retido pela construtora?

Hoje em dia, na prática, a postura do Poder Judiciário sobre a matéria, por orientação do Superior Tribunal de Justiça, é de que o limite da retenção por parte das construtoras oscila entre 10% e 25% do valor despendido pelo comprador. Esse limite mostra-se razoável a título de retenção, todavia, caso o contrato estipule percentual menor este deverá ser aplicado, da mesma forma que, sendo superior deverá ser reduzido.

Verifica-se a aplicação desses limites na jurisprudência:

Ementa: APELAÇÃO CÍVEL. SENTENÇA. CONTRATO DE PROMESSA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. INADIMPLEMENTO DO PROMITENTE COMPRADOR. RESOLUÇÃO. REINTEGRAÇÃO DE POSSE. DEVOLUÇÃO DOS VALORES PAGOS COM RETENÇÃO DE PERCENTUAL A TÍTULO DE INDENIZAÇÃO, BEM COMO DAS DESPESAS INADIMPLIDAS INCIDENTES SOBRE O IMÓVEL DURANTE O PERÍODO DE OCUPAÇÃO. DIREITO DE REMUNERAÇÃO PELA FRUIÇÃO DO BEM, DURANTE O PERÍODO DE INADIMPLÊNCIA. PRECEDENTES DO STJ. DECISÃO UNÂNIME. - Uma vez incontroverso o inadimplemento persistente do promitente comprador, deve ser declarada a resolução do contrato, em conformidade com previsão contratual e legal, determinando-se a reintegração de posse à promitente vendedora. - Rescindido o contrato por inadimplemento do promitente comprador, devem ser devolvidos os valores pagos pelo mesmo, assistindo ao promitente vendedor o direito de reter parte do montante, a título de indenização pelos prejuízos suportados, a ser arbitrado em percentual de 10% a 25%, em conformidade com as peculiaridades do caso concreto, abatendo-se, ainda, os débitos em aberto incidentes sobre o imóvel durante o período de ocupação, e reparação pela fruição do bem, a título de aluguéis, durante o período de inadimplência dos promitentes vendedores, cujo valor deve ser apurado em liquidação de sentença. - Precedentes do STJ. (TJ-PE - APL: 3685070 PE, Relator: Stênio José de Sousa Neiva Coêlho, Data de Julgamento: 16/06/2015, 1ª Câmara Cível, Data de Publicação: 07/07/2015)

Comprando de Imóvel

Qual o marco inicial para apuração do percentual a ser retido pela construtora?

O entendimento unânime do Poder Judiciário é de que o percentual deve ser aplicado sobre o valor pago até o momento da rescisão, eis que sua aplicação em outras condições mostra-se abusiva e contrária às normas do Código de Defesa do Consumidor. Conforme Jurisprudência.

CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AÇÃO ORDINÁRIA. DEFERIMENTO DE TUTELA ANTECIPADA. DETERMINAÇÃO DE RESCISÃO DO CONTRATO, SUSPENSÃO DE COBRANÇAS E RESTITUIÇÃO DE 80% DO MONTANTE DAS PARCELAS PAGAS E ABSTENÇÃO DE NEGATIVAR O NOME DO RECORRIDO. FIXAÇÃO DE MULTA COMINATÓRIA E AUTORIZAÇÃO PARA DISPOR DA UNIDADE IMOBILIÁRIA. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PRELIMINAR DE NECESSIDADE DE RECOLHIMENTO DO FRMP, SUSCITADA PELA PROCURADORIA DE JUSTIÇA. REJEIÇÃO. INEXISTÊNCIA EM SEDE DE RECURSO. MÉRITO. POSSIBILIDADE DE RESTITUIÇÃO DE PARCELA DAS QUANTIAS ADIMPLIDAS EM CONTRATO CUJO COMPRADOR TENHA DADO CAUSA AO DESFAZIMENTO. SÚMULA 543 DO STJ. ADMISSIBILIDADE DE RETENÇÃO DE PERCENTUAL ENTRE 10% E 25% PELA CONSTRUTORA/VENDEDORA. INCIDÊNCIA SOBRE TODA A QUANTIA PAGA. ARRAS CONFIRMATÓRIAS. SINAL QUE DEVE INTEGRAR A BASE DE CÁLCULO PARA APURAÇÃO DO MONTANTE A SER RESTITUÍDO. JUSTO PERCENTUAL A SER APURADO NA INSTRUÇÃO PROCESSUAL. AUTORIZAÇÃO DE RETENÇÃO, À LUZ DA PRUDÊNCIA, NO PATAMAR MÁXIMO ADMITIDO PELA JURISPRUDÊNCIA. AGRAVO DE INSTRUMENTO CONHECIDO E PARCIALMENTE PROVIDO. 1. Na fase recursal não há recolhimento do Fundo de Reaparelhamento do Ministério Público, mas tão somente do respectivo preparo, consoante se extrai do disposto no artigo 28 da Lei Complementar n.º 166/99, com a redação determinada pela LC 181/2000 e art. 4º da Lei nº 9.419/2010. 2. Consoante orientação do Superior Tribunal de Justiça, firmada no enunciado de Súmula 543, deve ocorrer a restituição imediata de parcela das quantias adimplidas em contrato cujo comprador tenha dado causa ao desfazimento. 3. O entendimento jurisprudencial do Superior Tribunal de Justiça é no sentido de que, em se tratando de relação consumerista, ainda que o consumidor/adquirente dê causa à resolução de contrato de compra e venda de imóvel, tem este o direito de ser restituído, em parte, do valor contratual efetivamente adimplido, admitindo-se a retenção de percentual entre 10% (dez por cento) e 25% (vinte e cinco por cento) pela vendedora. 4. Decerto que, apenas com a instrução processual, faz-se possível vislumbrar o justo percentual de retenção, razão pela qual afigura-se temerária a determinação de restituição de 80% (oitenta por cento) do montante pago, mormente porque por revelada a situação de dificuldade financeira vivenciada pelos agravados, que poderá ensejar a irreversibilidade da medida tal qual imposta pelo juízo a quo. 5. Assim, à luz da prudência, cabível a autorização de retenção, nessa fase processual, no percentual máximo, equivalente a 25% (vinte e cinco por cento) do montante pago pela compradora, ora agravada, devendo o ressarcimento, em consequência, limitar-se a 75% (setenta e cinco por cento) da quantia já adimplida. 6. O promitente comprador pode pedir a rescisão do pacto, independentemente de previsão contratual, no caso de não reunir mais condições de suportar o pagamento das prestações acordadas, sendo lícito ao credor reter parte dos valores pagos a título de ressarcimento pelos custos operacionais da contratação. 7. Consoante jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça, as arras ou sinal devem integrar a base de cálculo para apuração do montante a ser restituído ao consumidor que deu causa à resolução contratual. 8. Precedentes do STJ (REsp 907856, Rel. Ministro Sidnei Beneti, Terceira Turma, j. 19/06/2008; REsp 355.818/MG, Rel. Min. Aldir Passarinho Junior, Quarta Turma, j. 22/04/2003; REsp 1056704/MA, Rel. Min. Massami Uyeda, Terceira Turma, j. 28/04/2009; AgRg no REsp 1222139/MA, Rel. Min. Massami Uyeda, Terceira Turma, j. 01/03/2011; AgRg no AREsp 600.887/PE, Rel. Min. Raul Araújo, Quarta Turma, j. 19/05/2015) e do TJRN (Ag nº 2016.016385-1, Rel. Desembargador Claudio Santos, 1ª Câmara Cível, j. 21/09/2017; Ag nº 2016.015182-5, Rel. Desembargador Cornélio Alves, 1ª Câmara Cível, j. 09/03/2017; Ag nº 2017.005077-7, Relª. Desembargadora Judite Nunes, 2ª Câmara Cível, j. 19/09/2017; Ag nº 2016.013439-3, Rel. Desembargador Ibanez Monteiro, 2ª Câmara Cível, j. 16/12/2016; Ag nº 2017.007085-8, Rel. Desembargador Virgílio Macêdo Jr., 2ª Câmara Cível, j. 19/09/2017; AC nº 2015.011207-1, Rel. Des. João Rebouças, 3ª Câmara Cível, j. 15/09/2015; AC nº 2015.002050-3, Rel. Des. Amílcar Maia, 3ª Câmara Cível, j. 10/12/2015; Ag nº 2016.001292-5, Relª. Desª. Judite Nunes, 2ª Câmara Cível, j. 13/12/2016; Ag nº 2015.015533-2, Rel. Des. Cornélio Alves, 1ª Câmara Cível, j. 14/07/2016; Ag nº 2017.004829-1, Rel. Des. Virgílio Macêdo Jr., 2ª Câmara Cível, j. 01/08/2017). 9. Agravo de Instrumento conhecido e parcialmente provido, em dissonância do parecer ministerial. (TJ-RN - AI: 20170090063 RN, Relator: Desembargador Virgílio Macêdo Jr., Data de Julgamento: 14/11/2017, 2ª Câmara Cível)

Se a construtora não aceitar os termos que estabelece o Judiciário?

Se não houver acordo com a construtora, a alternativa do comprador é pleitear judicialmente a rescisão do contrato bem como a devolução dos valores pagos; a redução do percentual de retenção caso este se demonstre abusivo, e sua aplicação sobre o montante pago, declarando-se nula qualquer cláusula contatual em sentido contrário.

No caso de uma eventual ação, o comprador precisa continuar pagando as parcelas do imóvel?

No caso desta alternativa, além de o comprador ser obrigado a ingressar em juízo para garantia dos seus direitos de consumidor e para que não fique obrigado a continuar pagando algo que será restituído em parte no futuro, terá que requerer que a declaração de rescisão antecipada seja concedida em caráter liminar, evitando assim a continuidade dos pagamentos e a inscrição em órgãos de proteção ao crédito, prosseguindo o processo somente em relação ao montante a ser restituído.

CONCLUSÃO

Conforme o acima exposto:

O comprador/consumidor, pode rescindir o contrato por motivos pessoais, como por exemplo a insuportabilidade da prestação devida. Nesse caso o percentual a ser devolvido pelo vendedor, a título de compensação pelas despesas administrativas decorrente do contrato, será limitado ao percentual de 10% a 25% do valor, tendo por termo inicial a data da manifestação de vontade de rescisão pelo comprador. Não havendo um acordo amigável entre as partes o litígio poderá ser encaminhado para a análise do poder judiciário.

Raynara Suzielly Camacho  Raynara Suzielly Camacho